sexta-feira, 18 de junho de 2010

QUESTÃO DE GOSTO? - UMA CRÍTICA AO FORRÓ MODERNO


QUESTÃO DE GOSTO? - UMA CRÍTICA AO FORRÓ MODERNO



Iniciemos com uma viagem pelo tempo através de algumas lembranças das paradas musicais que “estouraram” na nossa região. A primeira onda que tenho lembrança foi a do rock nacional na década de 1980. Ainda criança, lembro do pessoal ouvindo muitos sucessos de bandas como RPM, Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, etc. Me vem à memória também o tempo da lambada. Beto Barbosa e Selminha estavam “estourados”. Diretamente da Bahia, veio o “furacão” do axé, com destaque para Luiz Caldas e Chiclete com Banana que abriram caminhos para muitos outros que fizeram com que esse ritmo não saísse mais das paradas. Vieram as duplas sertanejas, de vem em quando, principalmente na época do carnaval, o funk também caia e ainda cai no gosto do povo. Tivemos também o tempo em que os grupinhos de pagode eram a sensação. Enfim, “ondas musicais” não faltaram nos últimos anos.

No final dos anos 1980 e começo da década de 1990 o forró tinha seu espaço através de nomes como Alcimar Monteiro, Flávio José, Jorge de Altinho e outros. Foi então que, em 1993, a banda Mastruz com Leite, fez grande sucesso com um forró diferente, o chamado “forró eletrônico” e deu início ao movimento “Oxente Músic”. Ao lado dela surgiram muitas bandas de forró como Cavalo de Pau, Mel com Terra, Magníficos, Calango Aceso, etc.

Se por um lado essas bandas trouxeram o nosso ritmo mais tradicional para o topo das paradas, tornando o forró atraente para os jovens, elas também desvirtuaram o forró original, o típico “pé-de-serra”, e foram muito criticadas por isso, inclusive por nomes como Alceu Valença e Dominguinhos, que batizou o novo ritmo de “Forró de Plástico”. Entretanto, até aí, as temáticas das músicas giravam principalmente em torno de amor e temas nordestinos.

As festas da nossa região eram geralmente animadas por conjuntos musicais como Impacto Cinco, Montagem, Terríveis, Tuaregs, Grafith, Circuito Musical, etc. Eram bandas que tocavam de tudo, o que tornava as festas muito mais democráticas e bem menos tediosas. Tinha reggae, rock, axé, Jovem Guarda, música internacional, a tão esperada “música lenta” para os casais dançarem agarradinhos, além, é claro de forró. Em pouco tempo os conjuntos de forró foram ocupando o espaço desses grupos e passamos a ter festas inteiras só com forró, o que antes só acontecia nos “forrós” dos sítios.

Várias bandas se revezaram no topo das paradas. Recentemente, tivemos a fase em que o destaque foi para um forró mais romântico como os de Calcinha Preta, Limão com Mel e Desejo de Menina. Havia também um estilo que era mais característico das vaquejadas onde se destacavam nomes como Sirano e Sirino, Delmírio Barros, Tom Oliveira, Gaviões do Forró, etc. Com eles as canções giravam mais em torno de temas da chamada “vida de gado”, falavam de cachaça, de prostituição, enfim, exaltavam o chamado “cabra desmantelado”. Nos últimos anos, no entanto, as bandas passaram a adotar esse repertório e, infelizmente, caíram na boca do povo.

Hoje vivemos uma fase terrível em termos de “gosto musical”, praticamente todos os hits incitam o consumo exagerado de álcool, tratam a mulher como objeto, exaltam a prostituição e a infidelidade, são tempos de Aviões do Forró, Duquinha, Saia Rodada, Garota Safada e muitas outras. O ideal para essas bandas é que os rapazes sejam “safadões” e as moças “raparigas”. É duro ver artistas como Flávio José dizendo que às vezes falta motivação para compor sabendo que um indivíduo gritando três palavrões fará muito mais sucesso. A própria banda Calcinha Preta cantou recentemente: “se falar de cabaré, tá estourado! Se falar que é cachaceiro, tá estourado!” A que ponto chegamos!

No rastro dessa pornografia musical, para piorar, veio o modo de ouvi-la. Seja na base do “abra mala e solte o som” de Duquinha, ou do falado “paredão”, o que não faltam são imbecis que se exibem com sons nos mais altos volumes. Assim, além de ter a audição prejudicada pela poluição sonora, todos são obrigados a ouvir suas músicas. “Obrigados” entre aspas, pois a perturbação do sossego alheio é crime a qualquer hora do dia e as pessoas, depois de pedirem e não serem atendidas, deviam ter mais coragem de denunciar, os incomodados têm que mudar, como também as autoridades policiais devem intervir em prol da maioria.

Pode ser que alguns argumentem que se trata apenas de uma música e que ninguém está obrigado a fazer o que a letra diz. A realidade infelizmente mostra que essas músicas têm um efeito muito danoso. Hoje sabemos que a influência dos amigos é muito forte na formação da personalidade, na maioria das vezes maior que a dos pais. Sabemos também que o jovem procura sempre se destacar no seu grupo. Assim, tem sido cada vez mais comum vermos adolescentes consumindo álcool cada vez mais cedo, o que é muito ruim, pois os mecanismos cerebrais responsáveis pelo prazer ainda estão em formação nessa fase e ao impregnar o prazer do álcool será muito mais difícil largá-lo. Logo, quanto mais cedo se consumir álcool, mais chances de tornar-se um alcoólatra. Outra péssima notícia é o aumento de garotas consumindo álcool. Parece que quem não se embriaga não tá com nada. Saia dessa! Seja mais você!

Ao contrário do que a música mostra, cachaça não tem graça. Embora seja uma droga liberada, seu efeito social é mais devastador do que outras que são proibidas. Se analisarmos os crimes veremos que sua em sua grande maioria são cometidos sob o efeito do álcool. A tão exaltada “bagaceira”, ou seja, aquele fim de festa com quase todos bêbados, é onde mais acontecem brigas que fazem com que muitos jovens percam suas vidas ou as estraguem com anos de prisão. Para comprovar outro lado sinistro do álcool, procure falar que uma família com tem um alcoólatra e também será fácil conhecer outras que foram destruídas devido à “branquinha”. Será que nunca vai acontecer com você?

Até bandas já consagradas como Mastruz com Leite aderiram ao baixo nível. Veja um trecho da mensagem de encerramento de um site de fãs de Mastruz: “o grupo tomou outros rumos. Aquilo que criticávamos em outras bandas, (a apelação exacerbada, a imoralidade), agora também é uma bandeira mastruzeira. Seríamos hipócritas, se defendêssemos o Mastruz em detrimento dos outros grupos, enquanto o Mastruz não é mais nenhum referencial da boa música”.

O escritor Ariano Suassuna, depois de ouvir uma amostra com as músicas ‘Calcinha no chão’ (Banda Caviar com Rapadura),’Zé Priquito’ (Cantor Duquinha), ‘Fiel à putaria’ (Banda de Felipão Forró Moral), ‘Chefe do puteiro’ (Banda Aviões do forró), ‘Mulher roleira’ (Banda Saia Rodada), ‘Mulher roleira a resposta’ (Banda Forró Real), ‘Chico Rola’ (Banda Bonde do Forró), ‘Banho de língua’ (Banda Solteirões do Forró), ‘Vou dá-lhe de cano de ferro’ (Banda Forró Chacal), ‘Dinheiro na mão, calcinha no chão’ (Banda Saia Rodada), ‘Sou viciado em putaria’ (Banda Ferro na Boneca), ‘Abre as pernas e dê uma sentadinha’ (Banda Gaviões do forró), e ‘Tapa na cara, puxão no cabelo’ (Banda Swing do forró), fez uma forte crítica ao forró atual. Segundo o mestre, “... o que se autodenomina ‘forró estilizado’ continua de vento em popa. Tomou o lugar do forró autêntico nos principais arraiais juninos do Nordeste. Sem falso moralismo, nem elitismo, um fenômeno lamentável e merecedor de maior atenção. Quando um vocalista de uma banda de música popular, em plena praça pública, de uma grande cidade, com presença de autoridades competentes (e suas respectivas patroas) pergunta se tem ‘rapariga na platéia’, alguma coisa está fora de ordem.

Quando canta uma canção (canção?!!!) que tem como tema uma transa de uma moça com dois rapazes (ao mesmo tempo), e o refrão é ‘E vou dá-lhe de cano de ferro/e toma cano de ferro!’, alguma coisa está muito doente.

Sem esquecer que uma juventude cuja cabeça é feita por tal tipo de música é a que vai tomar as rédeas do poder daqui a alguns poucos anos… não precisa dizer mais nada…”

Ariano também enfatizou que uma situação musical semelhante aconteceu na antiga Iugoslávia quando o país estava esfacelando-se devido às guerras. Um estilo chamado turbo folk, com músicas de mau gosto cantadas por artistas seminuas, fez a cabeça da juventude. Um estudioso do país constatou que essa música representava uma geração que perdeu a crença nos políticos e nos valores morais.

Mas você pode pensar também que ouvindo sua música não está fazendo mal a ninguém. Ora, você está ajudando a disseminar esse lixo e quantos mais ouvirem, muitos mais ouvirão, por que infelizmente, até pessoas com certo nível educacional, que deveriam levantar a voz e dar exemplo, estão nessa de “Maria-vai-com-as-outras”. Pare para pensar na música que você está curtindo. Eu teria vergonha de comprar um CD ou ouvir esse tipo de música. Ao levar um CD desses para sua casa pense nos valores que você está passando para seus filhos.

Estamos numa sociedade que carece cada vez mais de bons exemplos. Fico imaginando o que passa pela cabeça de figuras como “Wesley Safadão”, que sabe que faz a cabeça de muitos jovens e segue lhes orientando para o que há de pior. Temos que ter cuidado com nossos ídolos, na MPB e no rock, por exemplo, também temos nomes, que não são exemplo de vida pra ninguém, como Tim Maia, Cazuza e Renato Russo, mais uma vez, é preciso discernimento. Figuras públicas deveriam ter mais cuidado com suas condutas e com o exemplo que estão passando.

Essas bandas só pensam em dinheiro. Elas procuram apostar no que nos temos de pior e o sucesso que fazem mostram que nosso nível moral, educacional e cultural é péssimo. Nós somos mais culpados do que as bandas. Somos nós que disseminamos esse tipo de música. Somos nós que ligamos para as rádios e, ao invés de criticá-las, pedimos para ouvi-las. Existem alguns administradores que, por incrível que pareça, gostam dessas bandas que contratam, outros, por outro lado, só pensam politicamente e procuram agradar a maioria.

Não nos enganemos achando que só o forró exalta o que não presta, praticamente todos os ritmos o fazem. Temos o rock que também está associado a drogas, temos o axé pornográfico, o funk, e muito mais. Cabe um mínimo de bom senso para separar o joio do trigo. A música brasileira tem uma diversidade maravilhosa, além de muita música internacional bacana que nossa juventude está fadada desconhecer limitando-se ao que há de pior de um único estilo ou que a mídia “manda” ouvir.

Enfim, ante o estrago que estas músicas fazem, não basta apenas que não ouçamos, é preciso que digamos em alto e bom som que elas não prestam, só assim influenciaremos outros e diminuiremos o prejuízo. Quando a chamada “questão de gosto” passa a prejudicar os demais ela tem que ser discutida sim. Ademais, acho que as pessoas deveriam pensar se realmente gostam dessas músicas ou se estão ouvindo só por que é sucesso. Falta personalidade! Falta atitude!



P.S. Sobre as festas juninas, espero que muitos curtam, revejam os amigos, passeiem, namorem, paquerem ou “fiquem”, dancem (se possível, sem dar ouvidos ao que essas atrações vão cantar) e bebam com moderação. Boas festas!!!

Prof. Jocelino Tomaz é professor na cidade de Caiçara na Paraíba /06/2010.

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