sexta-feira, 23 de julho de 2010

O SENADO É O PARAISO


Fábio Góis

No transcorrer de sua história, o Senado conquistou a fama de oferecer o emprego dos sonhos – e não só para os servidores. Segundo o antropólogo, etnólogo, educador e ex-senador Darcy Ribeiro (1922-1997), a instituição seria melhor do que o paraíso, uma vez que, para chegar até ela, “não é preciso morrer”. Trata-se de um dos concursos públicos mais concorridos do país, e os aprovados costumam comparar a aprovação com a chegada ao Éden: salários, planos de saúde, estrutura funcional, acesso gratuito a pós-graduação e cursos variados estão entre os atrativos. E, claro, o direito à almejada estabilidade no emprego.

Se o Senado oferece o céu para servidores – que acabaram de conquistar a aprovação do plano de carreira que pode mais do que dobrar suas remunerações finais –, a megaestrutura posta à disposição dos mandatários é igualmente generosa. E, depois de 186 anos de sua fundação (em 1824, por meio da primeira Constituição do Império), a Casa pela primeira vez traz à tona os detalhes inéditos – ao menos oficialmente – do que os senadores podem usufruir.

Confira a íntegra do documento publicado no Portal do Senado

Uma dessas benesses é a frota de 167 automóveis, dos quais 87 veículos oficiais para atender aos 81 senadores (seis reservas) e 43 são reservados para transportar de “servidores, documentos e material”.

Veja tabela da estrutura de transporte, regulamentada pelo Ato 10/2005 da Comissão Diretora:



“A última aquisição de veículos ocorreu em 2008, mediante processo licitatório. Foram adquiridas 4 vans para uso no Transporte Integração, beneficiando funcionários da Casa”, registra trecho do item “Outras informações”, o último do documento veiculado no portal eletrônico. A Polícia Legislativa do Senado, por exemplo, comprou quatro automóveis Nissan X-Terra, ano 2005, um caro jipe do tipo SUV.

Para por seus automóveis em movimento, cada senador tem direito a 25 litros de combustível por dia, não cumulativos, desde que estejam em Brasília. Como o gasto é definido para locomoções de segunda a sexta-feira, são postos à disposição dos parlamentares 125 litros por semana. Caso os deslocamentos sejam feitos nos estados, para exercício de atividade parlamentar, os gastos podem ser restituídos aos senadores por meio da verba indenizatória (R$ 15 mil mensais).

Sobre a verba indenizatória, o Senado estabelece que “os recursos podem ser utilizados no fretamento de meios de locomoção e no custeio de despesas de instalação e manutenção de escritórios de apoio, exclusivamente no estado do parlamentar”.

Passagens limitadas

Depois que o Congresso em Foco iniciou a série de reportagens exclusivas sobre a farra das passagens aéreas, Câmara e Senado tiveram de reduzir os gastos com cota de viagem e alterar o sistema de concessão do benefício (leia mais). Com o desdobramento das investigações, este site descobriu que, na Câmara, uma verdadeira máfia instalada em gabinetes fazia revenda irregular de passagens.

Depois de inúmeras reuniões em ambas as Casas e intensa repercussão junto à opinião pública e veículos de imprensa, a Câmara anunciou redução de 20% na cota aérea, bem como incluiu a contenção de gastos como meta. No entanto, manteve-se a utilização de créditos não usados, como também mostrou este site. A medida foi oficializada por meio do Ato 43/2009.

Já o Senado reduziu valores da verba de transporte aéreo em 25%. E, assim como a Câmara, liberou o uso de créditos antigos. Mas, ao contrário do que decidiram os deputados, o Senado descumpriu a promessa de que detalharia na internet os gastos dos senadores com passagens aéreas custeadas pela Casa. No documento de informações institucionais de que trata esta matéria, há apenas informações gerais sobre o uso do benefício.

“Segundo ato da Comissão Diretora nº 002/2009, cada senador faz jus à verba mensal correspondente a cinco trechos aéreos de ida e volta, no trecho capital do estado de origem/Brasília. Os valores, em virtude das distâncias, podem variar de R$ 6 mil a R$ 23 mil. [...] a verba de transporte aéreo poderá ser utilizada por assessor do parlamentar, desde que autorizado por escrito pelo senador, e devidamente comunicado à Mesa Diretora”, esclarece o material, destacando ainda que a cota não é cumulativa de um ano para outro e só pode ser utilizada pelo senador no exercício do mandato.

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Moradia, saúde e 14º

O subsídio mensal de R$ 16.512,09 é o mais simbólico dos atrativos oferecidos aos senadores. Benefícios diversos multiplicam em quase dez vezes o custo final mensal dos parlamentares. Para dar conta dos gastos funcionais, o orçamento anual do Senado tem se aproximado de R$ 3 bilhões – R$ 2,7 bilhões em 2009, dos quais R$ 2,2 bilhões (81%) foram reservados apenas para a folha de pagamento. Para efeito de comparação, Recife e seus mais de dois milhões de habitantes dispuseram de R$ 2,3 bilhões no orçamento do ano passado.

O documento explica que “não há pagamento de décimo quarto salário” para os congressistas. Mas, em seguida, apresenta-se uma explicação conflitante, a título de “ajuda de custo”: “Os senadores recebem uma ajuda de custo no valor de R$16.512,09, no início (fevereiro) e no final (dezembro) da sessão legislativa”. Levantamento produzido por este site e veiculado no último dia 7 mostrou que, mensalmente, os gastos apenas com senadores se aproximam de R$ 150 mil. (confira)

Por meio do auxílio-moradia, por exemplo, fica estabelecido que o senador que não quiser apartamento funcional tem direito, todo mês, a R$ 3,8 mil para livre uso com aluguéis ou diárias em hotel. “As despesas precisam ser declaradas e comprovadas formalmente”, exige o regulamento da Casa.

Outra benesse concedida aos senadores (e até ex-senadores) é atendimento médico e odontológico. Para o senador em exercício, “não há limite para despesas médicas”, das quais também se beneficiam “cônjuge e dependentes com até 21 anos ou até 24, se universitários”. “O limite anual para despesas odontológicas e psicoterápicas é de R$25.998,96”, acrescenta a cartilha virtual.

Já os ex-senadores seguem o exposto em ata da 3ª reunião ordinária da Comissão Diretora (18 de setembro de 2003). Na ocasião, ficou estipulado um limite anual de despesas “médicas, psicológicas, hospitalares e odontológicas” em 84.508 CH (coeficiente de honorários médicos), o que equivale a R$ 32.958,12 – valor mensurado em 16 de junho de 2010.

“O benefício é extensivo apenas ao cônjuge (não incluídas despesas odontológicas; nesse caso, o cônjuge pode receber tratamento diretamente junto ao Serviço de Assistência Médica e Social)”, diz o material veiculado, acrescentando que, para ter direito a esses benefícios, o ex-parlamentar deve ter exercido mandato na condição de titular, bem como deve provar que não ocupa cargo público e que não é atendido por outro sistema de Previdência Social.

O material, no entanto, não informa que suplentes de senador passam a ter direito a aposentadoria integral e plano de saúde vitalício se, em decorrência de licença do titular, exerça por mais de seis meses o mandato. A atual legislatura (2007-2010), que registrou a mais grave crise institucional do Senado (o caso dos atos administrativos secretos), chegou a ter 20 suplentes entre os 81 senadores. Nenhum deles, entretanto, ficou por mais de 180 dias no exercício do cargo.

Fonte: Congresso em Foco

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